quarta-feira, 28 de junho de 2006

Preocupações em torno do Petróleo - NÃO ESTAMOS PREPARADOS!

O petróleo, o seu preço e as suas reservas são, nos dias que correm, notícia em todo o mundo ocidental.

É certo e sabido que, com a euforia do Mundial, falar de temas sérios é quase uma heresia. Se assim é, não me importo de ser herege.

Um dos maiores especialistas portugueses no assunto é José Caleia Rodrigues. A sua entrevista à «Executive Digest» deste mês de Junho é muito preciosa. Vale a pena ser lida na íntegra. Não havendo recurso digital, façam favor de comprar a de papel, ou pedir emprestado.

Cruzando essa entrevista com a peça jornalística que foi publicada na revista «Dinheiro SA», e outras notícias soltas dos jornais dos últimos tempos, podemos tirar conclusões assustadoras para o futuro. Entre elas saliento:

  • O preço do crude tem subido por vários motivos: dependência mundial do petróleo, instabilidade política em países produtores e catástrofes;
  • Se todos os poços de petróleo existentes no mundo estiverem em pleno funcionamento, a capacidade de produção é de 86,5 milhões de barris por dia;
  • O consumo mundial de petróleo está nos 85 milhões de barris por dia, ou seja, estamos a consumir tudo o que se produz, pelo que os preços altos são a única forma de regular o mercado;
  • Entre Janeiro de 1999 e Abril de 2006, o preço do barril de crude subiu de 11 para 70 dólares;
  • Até final deste ano, o preço do barril de crude deverá subir até aos 100 dólares;
  • Nessa altura, a gasolina poderá chegar aos 2 €por litro, algo impensável até há pouco tempo atrás;
  • Portugal importa anualmente cerca de 100 milhões de barris por ano o que, a 70 dólares por barril dá 7 mil milhões de dólares;
  • Portugal importa anualmente cerca de 100 milhões de barris por ano o que, a 70 dólares por barril dá 7 mil milhões de dólares;
  • Se o mesmo preço chegar aos 100 dólares por barril, a factura adicional anual (o impacto negativo nas contas) será de 3 mil milhões de dólares;
  • Segundo o Banco de Portugal, por cada 10 dólares de aumento do preço do barril de crude (e estamos a falar de 30 até final do ano), a economia deixa de crescer 0,5% - logo, falamos de uma perda de 1,5% do crescimento do PIB já em 2006, se o barril de crude chegar, de facto, aos 100 dólares;
  • Se isso acontecer, o aumento geral dos preços é inevitável (inflação) e com ela surgirá novo aumento das taxas de juro;
  • Com o aumento do preço da gasolina, a diminuição do crescimento do PIB e o aumento das taxas de juro, quem se endividou viverá muito pior;
  • O preço do petróleo nunca mais deverá registar descidas bruscas; pelo contrário, deverá subir continuamente sem limite;
  • Com esta nova regulação da ordem económica mundial, a China e a Índia estão a emergir como as novas potências económicas mundiais;
  • O novo oleoduto da Rússia (maior produtor mundial de petróleo, com 11,7 milhões de barris por dia em Janeiro deste ano), com 4 mil quilómetros de extensão e que chega à China (que também produz petróleo) garante, por um lado, capacidade aos chineses para continuarem a crescer economicamente e, por outro, poder económico à Rússia;
  • Estima-se que a Rússia esteja a receber, diariamente, pelas suas exportações de hidrocarbonetos (petróleo e gás natural) qualquer coisa como 328 milhões de dólares. Repito, é por cada dia que passa, o que perfaz quase 120 mil milhões de dólares por ano. Notável;
  • Ao contrário, apesar de produtores, os americanos não conseguem satisfazer a procura interna com os seus recursos produzidos, pelo que estão a importar hidrocarbonetos à média de 700 milhões de dólares por cada dia que passa;
  • Além disso, o peso da força militar americana é o maior de todo o planeta, o que pesa e muito na sua economia;
  • O centro geo-político-económico vai mesmo mudar para um espaço geopolítico que vai do extremo leste europeu até à Ásia;
  • O oleoduto da Rússia para a China está preparado para poder chegar ao Japão;
  • Segundo Caleia Rodrigues, Portugal corre mesmo o risco de não ter dinheiro para pagar o petróleo de que precisa, o que será dramático;

Perante tudo isto, o que tem Portugal de fazer?

Resposta simples pela ligeireza dos argumentos e soluções, mas igualmente complexa pela difuldade da sua aplicação prática. Por um lado, temos de racionalizar consumos, o que significa gastar menos. Temos de aprender a viver com menos. Coisa difícil, muito difícil, mas inevitável, com profundas alterações sociais e económicas no país.

Por outro lado, Portugal tem água, sol e vento, elementos essenciais a uma firme política de aposta em energias alternativas. É igualmente inevitável, não é um capricho ou uma moda, tem mesmo de ser.

Por fim, investir na inovação tecnológica. Por isso, compreendo cada vez melhor o alinhamento de discursos entre Primeiro Ministro e Presidente da República. Cada um a seu modo querem preparar Portugal para as imensas dificuldades que aí vêm mas não querem, para já, criar uma onda de alarmismo. Sentido de responsabilidade que se compreende, claro está.

Não se pense que sair de Portugal para qualquer outro país europeu, a fim de procurar uma vida melhor, irá servir de muito.

Não, o desafio será comum a todos os países da Europa. Por isso, a Comunidade Europeia, que começou por ser do Carvão e do Aço (CECA, de onde derivou para CEE e depois EU) deverá começar por aprofundar, como nunca até aqui, o caminho das energias alternativas e da inovação tecnológica. Algo que tem de ser muito mais materializado nos instrumentos comunitários de ajuda aos países membros da União Europeia. O caminho tem de ser iniciado ontem, à míngua de uma política europeia para o petróleo a qual, de resto, nunca existiu, inexplicavelmente.

Já vamos tarde, talvez não tarde demais se o que tem de ser feito começar a verificar-se a curto prazo.

Fico muito preocupado com tudo isto mas, como disse no início, é matéria que não agrada à maioria das pessoas, muito menos agora, com Portugal a preparar-se para jogar os quartos-de-final do Campeonato Mundial.

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