domingo, 10 de dezembro de 2006

A Entrevista

Marques Mendes é bom homem, parece-me sério e tem um passado político de inquestionável serviço e dedicação.
Mas a verdade é que está mais do que provado de que dificilmente convence o eleitorado, aquele que decide. A prova disso são as mais recentes sondagens, que dão o PS com maioria absoluta, apesar de a imagem do Governo não ser muito forte. O líder do PS, José Socrates Pinto de Sousa continua em alta e é à sua custa que o PS continua em alta.
É essa imagem de líder forte, renovador, reformista, capaz de empreender as tarefas de que Portugal precisa que o projecta para níveis elevados de popularidade e aceitação, apesar de ele não ser aquilo que aparenta e de as reformas não serem o que nos querem fazer passar. A verdade é que Portugal, estruturalmente, não melhora em diversas áreas e muitas das medidas são inadequadas, de mera cosmética ou de simples propaganda. Mas isso o povo em geral não alcança.
O contraste desta imagem é a que reveste a personalidade de Marques Mendes. Certinho, bem comportadinho, bom chefe de família mas sem rasgo, sem carisma.
Ora bem: o carisma. É isso que está na base da fulanização da política em Portugal e esta nunca foi tão evidente como nos dias de hoje.
O momento escolhido por Nuno Morais Sarmento não poderia ser melhor. Sócrates em alta, Marques Mendes a teimar não descolar na posição cinzenta a que nos habituou, Durão Barroso e Santana Lopes fora de jogo, Luís Filipe Menezes num jogo que os militantes não apreciam, Marcelo cada vez mais confinado ao papel de entretainer semanal (em queda de audiência a cada Domingo que passa). Portugal está num interregno de eleições, com tempo para se pronunciar (apenas) sobre a descriminalização da IVG, a mais ou menos metade do mandato de Sócrates.
Este é o tempo certo para uma "Nova Esperança". Pelo menos assimo deve pensar Nuno Morais Sarmento e seus pares.
Reconheço-lhe dimensão de líder, gostei que ele tivesse assumido um papel activo na definição de uma alternativa que concorra em 2009 (muito provavelmente no mesmo dia das eleições autárquicas!) contra José Socrates. Gostei mesmo de alguns nomes que ele mencionou, designadamente José Pedro Aguiar-Branco ou Rui Rio, como fazendo parte do mesmo grupo geracional.
Contudo, duas cautelas se impõem:
Primeiro, o projecto não pode cingir-se ao "geracional"; deve assentar em competências técnicas e políticas multidisciplinares, independentemente da idade.
Segundo, alguns nomes próximos do "barrosismo" resistente e citado na entrevista do DN e da TSF, deveriam ser excluídos do "lote", por serem pernicioisos, viciosos e atentatórios de uma reforma de mentalidades e um mais que exigido expurgo de vícios no PSD.
Se houver essa capacidade e essa coragem, NMS poderá ter sucesso amplo no partido e no país. Se, ao invés, os caciques, controleiros e carreiristas sem profissão continuarem no domínio da máquina do PSD e os pretenderem empurrar para o domínio da máquina do Estado, não estarei nesse lado.
Para que fique claro e, logo à partida, é o que se me oferece dizer.
NMS merece o meu respeito, reforçado desde o dia em que, através da entrevista a Maria João Avillez, assumiu o "pecado" do seu passado errático e desviante. Com isso, cresceu e ganhou respeito, assumindo que é (sempre) possível recomeçar e refazer o rumo, com respeito, dimensão humana, competência técnica e projecto político. O que lhe reconheço.
Na hora de decidir, entre avançar ou não avançar, NMS via ter de ponderar se quer contribuir para uma nova alvorada (não vejam aqui semelhanças com nada) ou se pretende levar consigo alguns esqueletos bolorentos que representam o pior que o PSD andou a criar desde a génese do cavaquismo.
Nunca falei tão claro e nunca granjeei tantas inimizades. Podia estar calado e ser conivente mas isso seria deixar de ter a minha marca identitária.
Mas não. Fica aqui, preto no branco.

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