segunda-feira, 14 de agosto de 2006

O medo causado pela inteligência

Recebi hoje um mail muito interessante que penso muitos estarão a receber também. Não resisto aqui a colocá-lo até porque me sinto estranhamente vítima desse mal.
Trata-se de um texto de um brasileiro, de seu nome José Alberto Gueiros e foi publicado originariamente no «Jornal da Bahia», em 23 de Setembro de 1979, ou seja, há 27 anos. Cá vai:
"Quando Winston Churchill, ainda jovem, acabou de pronunciar o seu discurso de estreia na Câmara dos Comuns, foi perguntar a um velho parlamentar, amigo de seu pai, o que tinha achado do seu primeiro desempenho naquela assembleia de vedetas políticas. O velho pôs a mão no ombro de Churchill e disse, em tom paternal: «Meu jovem, você cometeu um grande erro. Foi muito brilhante neste seu primeiro discurso na Casa. Isso é imperdoável. Devia ter começado um pouco mais na sombra. Devia ter gaguejado um pouco. Com a inteligência que demonstrou hoje, deve ter conquistado, no mínimo, uns trinta inimigos. O talento assusta».
E ali estava uma das melhores lições de abismo que um velho sábio pode dar ao pupilo que se inicia numa carreira difícil. A maior parte das pessoas encasteladas em posições políticas são medíocres e tem um indisfarçável medo da inteligência. Isso na Inglaterra. Imaginem aqui noutros países. Não é demais lembrar a famosa trova de Ruy Barbosa:
«Há tantos burros mandando em homens de inteligência, que às vezes fico pensando que a burrice é uma Ciência».
Temos de admitir que, de um modo geral, os medíocres são mais obstinados na conquista de posições. Sabem ocupar os espaços vazios deixados pelos talentosos displicentes que não revelam o apetite do poder. Mas é preciso considerar que esses medíocres ladinos, oportunistas e ambiciosos, têm o hábito de salvaguardar suas posições conquistadas com verdadeiras muralhas de granito por onde talentosos não conseguem passar. Em todas as áreas encontramos dessas fortalezas estabelecidas, as panelinhas do arrivismo, inexpugnáveis às legiões dos lúcidos.
Dentro desse raciocínio, que poderia ser uma extensão do Elogio da Loucura de Erasmo de Roterdam, somos forçados a admitir que uma pessoa precisa fingir de burra se quiser vencer na vida. É pecado fazer sombra a alguém até numa conversa social. Assim como um grupo de senhoras burguesas bem casadas boicota automaticamente a entrada de uma jovem mulher bonita no seu círculo de convivência, por medo de perder seus maridos, também os encastelados medíocres se fecham como ostras à simples aparição de um talentoso jovem que os possa ameaçar. Eles conhecem bem suas limitações, sabem como lhes custa desempenhar tarefas que os mais dotados realizam com uma perna nas costas, enfim, na medida em que admiram a facilidade com que os mais lúcidos resolvem problemas, os medíocres os repudiam para se defender. É um paradoxo angustiante.
Infelizmente temos de viver segundo essas regras absurdas que transformam a inteligência numa espécie de desvantagem perante a vida. Como é sábio o velho conselho de Nelson Rodrigues: «Finge-te de idiota e terás o céu e a terra».
O problema é que os inteligentes gostam de brilhar. Que Deus os proteja".
É incrível a actualidade deste texto face aos políticos que ocupam o grande espaço do centrão. É incrível como este texto vem ao encontro da teoria da boa e da má moeda relembrada por Cavaco Silva há cerca de dois anos atrás.
O partido a que pertenço não foge a esta realidade. Por pudor não me alongarei. Mas como me revejo neste texto. Claro que, para mim, felizmente, faço parte dos inteligentes: tenho o caminho sempre tapado mas sou bem melhor do que a maioria dos "eucaliptos" que proliferam nos partidos do "bloco central de interesses", esse largo espectro político, largamente vazio de ideal e apenas sobreposto pela ditadura do cartão de crédito, laranja de um lado, rosa do outro.
Disse. E disse demais.

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